Poema “Bragança” de Jorge Ramos

Posted by Acervo Cultural Bragança Pará on janeiro 01, 2023 | No comments

 

Bragança beira-rio, cidade presépio,

minha Bragança de São Benedito,

cheia de sonhos e poetas:

- Onde estás De Castro de Souza?

-Em que estrela te escondes Alírio Pinheiro?

Eu te pergunto, Bragança minha,

onde perdi aquela pureza de infância,

onde ficou aquela meu primeiro sonho-fantasia,

em que pedra está o epitáfio muito frio

e muito triste do meu primeiro desengano?...

 

Ah, casarão colonial de tanta luz, meu berço,

de vento batido, sobrado da Rua do Mar,

onde aprendi a ser livre como o vento,

a ser sentimental com as cantilenas dos barqueiros,

a ser poeta com o poente sobre o Caeté

a lua cheia, amarela, como rosa chá,

despetalando-se miríades, enquanto mudo que nunca esqueci...

 

Ah, Bragança de meus amores, finados amores,

 onde à luz do luar haviam violões em serenatas,

em que mundos perdi a rara e doce emoção

de já não saber te contemplar tranquila e serena

 nessas noites misteriosas, como fazia outrora!...

 

 Ah, a alma de tua tradição afro-ameríndia,

cidade cheia de lendas e muitos amores:

-Lá vai São Bendito, preto velho, bom e batuta,

todo fim de ano a sua esmolação!...

(Santo milagroso, Santo do meu povo,

A tua casa é a casa da gente cabocla

Que confia muito na tua proteção!...)

 

São João, meu São João da Aldeia!... Ah, que saudades,

vou passar fogueira novamente,

vou acender o meu balão,

Meu São João, “acende a fogueira do meu coração”,

há invernia e tristeza, a tua casa o vento levou,

mas em nós, Voz do Deserto, ainda restou

a tua sagrada devoção...

 

 São Raimundo da Penca, os trilhos da velha ferrovia

eram o caminho e o convite,

havia a tua fé, a tua grande procissão

e a cabocla brejeira,

festa do povo que o vento e o progresso levou!

 

Sta. Teresinha, a pálida monja de Antônio, o devoto

aos teus pés, na capela do morrozinho,

casais de enamorados e tardes tão líricas,

construíram castelos em sonhos tão puros e tão cândidos!...

Recebe o teu devoto que se foi tão contente

de te conhecer como a mais santa de todas as santas!...

 

Bragança beira-rio, cheio de sonhos,

e sempre havia a menina-moça de cabelos cheios de viração,

e no rosto uns olhos doidos cheios de emoção!...

 

Bragança minha, há saudades no coração,

eu te trago minha alma, minhas mágoas e minhas palavras pobres,

eu toco tua terra e me redimo,

e nestas ruas encontro a tua madrugada sorrindo para mim,

e há a eterna promessa sempre renovada

de ser sempre teu, minha doce amante,

e sinto, de leve, teu beijo de amor

nos meus lábios que sussurram eternamente:

_ VIVA A BRAGANTINIDADE!...

 

Autor: Jorge Daniel de Souza Ramos
Imagens:IBGE Cidades

Referência

Ramos, Jorge Daniel de Souza,1927 - 1981. Toda a poesia de Jorge Ramos. Organização de Celso Luiz Ramo de Medeiros.- Brasília: C.L.R. de Medeiros, 2010, p. 45 a 47.


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